segunda-feira, 10 de novembro de 2008

Sobre a individualidade

Ante-sala do consultório, senhoras conversam:


Meus filhos teêm-me dado um trabalho! Um vive perdendo o emprego, depois que terminou o colégio não quis mais saber de estudar, o pai queria tanto que ele fosse engenheiro. Ele acha que vai poder morar conosco até os trinta anos. O outro nunca pára em casa, quando está fica o tempo todo trancado no quarto estudando, não conversa, nunca me conta nada é como se ele nem estivesse lá.


E o meu então, não quer assumir o meu neto. É verdade que ele sempre manda o dinheiro da pensão, mas tem que gostar da criança, levá-lo em casa para eu ver como ele está. Também, a moça é uma paspalha não conseguiu fazê-lo casar, quando engravidei casei antes mesmo da barriga começar a aparecer.


Eu depois que casei demorei cinco anos para ter a minha, ela chorou até o sexto mês sem parar. Agora que está na escola, não gosta de estudar, fica cantando aquelas músicas horrorosas, vive comendo doces, está ficando cada vez mais gorda. Quando chegar a adolescência não sei como vai ser.


Entra uma moça com ar jovial, elas a escutam conversar com a recepcionista:


Seus exames pré-operatórios chegaram, poderá marcar para qualquer dia dessa semana.


Que ótimo, vou aguardar. Obrigada.


A senhora mais velha, e por isso com maior permissão social, senta-se ao lado da moça que acabará de chegar e lhe pergunta:


Puxa, uma moça tão jovem. Vai operar por que?


Obrigada pelo tão jovem. Agora que já passei dos trinta vou fazer esterilização.


E quantos filhos têm?


Nenhum. E nem eu ou meu marido desejamos, somos muito felizes só nós. Caso um dia mudemos de idéia preferimos adotar uma criança.


Que absurdo! Eu sei que você quer ter, converse com seu marido. Nenhum casal é feliz sem filhos, eles são a materialização do amor do casal. Você nunca será feliz se não der um ao seu marido!


Eu já sou feliz, não vejo motivos para colocar mais uma criança nesse mundo. Acho um projeto muito egoísta. Vou ter um filho para moldá-lo a minha forma? Projetar meus sonhos frustrados sobre ele? Não vou além de detonar meu corpo esperar que ele saía de casa para ter paz novamente.


A senhora levanta-se vermelha e volta para o grupo de onde saiu. A moça ri discretamente.


Vocês viram isso! Onde já se viu ser casada e não querer ter filhos, egoísmo é não querer gerar uma criança. Eu jamais seria feliz sem os meus meninos, eles são a melhor coisa que me aconteceu.


As outras concordam, porém pensam se seria melhor não terem tido os filhos.

2 comentários:

André Rocha disse...

Muito bom!!! Penso que a condição dos que precisam ter filhos é uma das mais miseráveis, pois são tão pequenos, tão vazios, tão incompletos que necessitam de uma ocupação vitalícia pra se preencher, mesmo que essa só traga decepções...a racionalidade foge desses enquanto a carência se aproxima e faz morada no seu corpo, pois passar mal a vida toda e se contentar só com um sorriso é quase(se não o for) patológico...Beijo!

FK disse...

Descobrir seu blog no Pipoca e nanguim, devo lhe parabenizar pelo otimo trabalho e lhe pedir para que continue escrevendo, voce escolhe muito bem as palavrasficam sempre bem colocadas deixando o texto agil e poetico adoraria ouvir uma conversa sua e saber se voce usa as palavras escritas em sua voz.